UMA ESTRATÉGIA NA CRIAÇÃO
DE CÃES: ESTABELECIMENTO DE UMA “LINHA DE SANGUE”
Há 23 anos criando cães
(dogues alemães e, recentemente, rottweiler), observo que muitos criadores
escolhem os acasalamentos baseados apenas no fenótipo dos animais. Há dias, um
criador de rottweilers chegou ao ponto de dizer que não usaria um determinado e
bonito padreador porque já tinha “o sangue dele” em seu plantel (sic). Ora,
deveria ser exatamente o contrário ...
O fenótipo é o reflexo
dos genes portados pelo cão. Genes dominantes, que “cobrem” os genes recessivos.
Estes não aparecem no fenótipo, salvo se forem homozigotos. Assim, o mais importante
é que os cães, que vão acasalar, tenham uma boa genética, que reflita na
aparência física dos seus filhotes (genótipo forte).
O ideal é que estes cães sejam homozigotos, vale dizer, sejam portadores apenas dos genes determinantes da boa característica desejada. O cão só pode transmitir à sua prole um gene de que seja possuidor. Assim, melhor ainda se ele for homozigoto em genes dominantes, pois os seus filhos os receberão necessariamente e isto se refletirá no fenótipo de toda a ninhada.
Através de apenas acasalamentos “abertos” (outbreeding ou outcrossing) o criador jamais estabelecerá uma linhagem em seu plantel. Mesmo que ele, por sorte, obtenha um cão homozigoto, perderá esta qualidade no próximo acasalamento “aberto”... Aliás, ele sequer saberá que tenha tido em seu plantel este cão homozigoto... Isto somente poderá ser constatado, estatisticamente, através de várias gerações resultantes de acasalamentos “em linha”, sempre usando os recursos da estatística.
Com acasalamentos abertos, lastreados apenas no fenótipo, o criador poderá, por sorte, obter um excelente exemplar da raça que está criando, logrando vitórias em exposições de beleza. Entretanto, sua prole será heterogênea e pode não ter um filhote de igual qualidade, tudo se perdendo a partir deste acasalamento e dos futuros.
É o que pode ocorrer com a custosa importação de um ótimo rottweiler, não homozigoto nas boas características, que pode transmitir à sua prole uma característica ruim (recessiva), que estava encoberta pelo gene dominante do cão trazido do estrangeiro.
Desta forma, para se
estabelecer uma “linha de sangue” de origem estrangeira, impõe-se trazer dois
cães consanguíneos ou, pelo menos, um cão geneticamente dominante (homozigoto,
fruto de acasalamentos em linha). Assim mesmo, aqui no Brasil, o criador terá
de seguir com acasalamentos entre parentes para que a genética desejada não se
perca, não seja diluída, pulverizada ou perdida por acasalamentos abertos no
futuro.
Evidentemente, os acasalamentos consanguíneos devem ser muito bem estudados, devendo ser verificado se os ascendentes dos cães escolhidos não são portadores de algum gene indesejado. Isto pode ser percebido através da observação da saúde e qualidade de cerca de quatro gerações dos ascendentes dos cães que vão ser acasalados. Tudo é uma questão de estatística, pois certeza nunca se terá. Mais estes riscos existem também nos acasalamentos abertos.
Certo que, algum dia, o criador terá de programar um acasalamento não consanguíneo para diminuir os riscos da consanguinidade. Neste caso, o ideal é que ele use um cão de uma outra boa “linha de sangue”, cuja ascendência, sadia e correta, ele conheça muito bem, evitando trazer para o seu plantel uma doença ou defeito morfológico que poderão prejudicar severamente a sua criação, para sempre ou por muitas gerações.
Em resumo: na escolha de um acasalamento, o criador deve escolher muito bem os fenótipos dos cães que serão usados, bem como estudar atentamente a genética de ambos, buscando fixar características através de acasalamentos em linha, obtendo proles de bons homozigotos. Um cão apenas não tem condições genéticas para estabelecer uma linha de sangue.
Afranio Silva Jardim,
titular do Canil Jardim Silva, registrado na CBKC sob o n.1759/2000
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