ROTTWEILER, AINDA SERÁ POSSÍVEL SALVAR A RAÇA?

 

Temos asseverado, reiteradamente, o que nos parece ser o óbvio: sem tipicidade, não existe raça canina.

As características morfológicas, que uma determinada raça deve possuir, estão definidas e explicitadas no respectivo padrão oficial. Vale dizer, a tipicidade de uma raça de cães se extrai do padrão.

Estes textos são publicados e homologados pela confederação internacional de cinofilia (FCI), a qual é filiada a nossa confederação (CBKC). A FCI adota o padrão constituído pelo clube do país onde foi criada a raça. No caso do nosso Rottweiler, o clube alemão é conhecido pela sigla ADRK.

Como se sabe, a tradução do padrão da raça Rottweiler está publicada nos sites da CBKC e dos vários clubes especializados, bem como no Conselho Brasileiro da Raça Rottweiler (CBRR), sendo facílimo o acesso a esse texto escrito.

 Entretanto, é forçoso reconhecer que muitos criadores da nossa raça desconhecem o seu padrão, desenvolvendo a sua atividade através de um conhecimento empírico, superficial e prático. São muito influenciados pelo apela comercial.

Outros criadores conhecem o padrão oficial de nossa raça, mas não o estudaram, não leram e refletiram sobre seus vários aspectos. O texto do padrão deve ser lido e relido constantemente. Só assim se tem dele uma visão sistemática e melhor se compreende o seu “espírito”. O brasileiro não é muito afeito ao estudo, mormente a uma leitura reiterada e sistemática ...

Por outro lado, o público que vai adquirir os filhos destes criadores, por serem leigos e não conhecerem o padrão rácico, são direcionados pelo gosto pessoal.

Ora, os conceitos de beleza são variáveis no tempo e espaço, muito influenciados por “modismos”, por isso, transitórios. Já o padrão oficial da raça busca ser perene e visa preservar um tipo de cão determinado.

Desta forma, a preservação de uma raça canina pressupõe a constante, permanente e rígida obediência às regras do padrão rácico, o qual descreve as características morfológicas que distinguem uma raça de outra raça, características estas que são transmitidas geneticamente. Fenótipo e genótipo devem “andar” juntos.

Também o temperamento das raças é explicitado pelo seu padrão e tem grande relevância para uma criação correta e responsável.

A nossa realidade atual está demonstrando um grande desvio do que exige o padrão da raça Rottweiler. Esta raça está sendo desvirtuada e corre o risco de se perder no curto prazo. Estão criando cães muito diferentes do que exige o padrão oficial.

Estão criando verdadeiros “monstrengos”, exemplares não funcionais, com risco à sua saúde e ao seu bem estar, preocupações explicitadas no padrão rácico.

Ademais, a movimentação “lenta durante e trote”, própria dos cães de frente muito larga e pescoço curto, é punida expressamente como falta grave pelo padrão da nossa raça.

Ora, o padrão oficial da raça Rottweiler é claro e assertivo ao punir com falta grave o cão que apresentar uma “aparência geral pesada” e ter um “tipo muito molossóide”.

O padrão desvalora a cabeça muito larga entre as orelhas, com stop muito pronunciado, testa alta, focinho curto, rugas e excessivas barbelas.

Pelo padrão, o pescoço deve ser “forte, moderadamente longo, bem musculoso, com linha superior ligeiramente arqueada e seco, sem pelo solto”.  A comissura labial ‘não deve ser visível (fechada)”.

Os olhos devem ser de tamanho médio e amendoados, vale dizer, não devem ser muito frontais, redondos, arregalados e juntos entre si, como ocorre na raça Pug, Buldogue e outras que possuem a cabeça braquicéfala.

O Rottweiler não deve ser um cão “atarracado”, pois o padrão exige coxas “moderadamente longas” e “pernas longas ...”.

Nos dias atuais, percebe-se que estamos perdendo o controle sobre a tipicidade da raça e o Rottweiler está se afastando das suas características essenciais. Se criarmos regidos pelos gostos pessoais, a raça se dispersa e acaba por desaparecer. O padrão oficial é que realiza este essencial amalgama, buscando uma uniformidade na criação dos rottweilers. O padrão é a “lei máxima” de qualquer criação de raças.

Saliente-se um outro problema. Mesmo os criadores responsáveis e experientes já não estão percebendo estes desvios em sua criação. É até natural nos acostumarmos com o que presenciamos constantemente. Por outro lado, os árbitros também acabam aceitando estas transformações morfológicas, não as punindo nas respectivas exposições caninas, até porque, alguns, são ou foram criadores de rottweilers.

Mesmo que assim não fosse, mesmo que a “nata da cinofilia” estivesse atenta e interessada em evitar estes desvios morfológicos na criação do Rottweiler (eles ocorrem também em outras raças), a eficácia de suas atividades seria muito pequena, pois a grande maioria dos criadores não frequenta exposições e não é filiada aos clubes especializados. Estes criadores atuam mais influenciados pelo chamado “mercado” e não se esmeram no estudo da genética e do padrão, conforme apontado acima.

Fica, então, uma importante indagação: o que fazer para reverter esta nefasta e deletéria tendência?

Como todo fenômeno social, não há solução simples ou “mágica”. Entretanto, é urgente agir, é urgente que saiamos desta postura omissa e meramente contemplativa.

Julgo grave a situação atual da nossa raça e  urgentes medidas concretas deve ser adotadas para salvá-la. É necessária uma grande mobilização de todos e todas que já tomaram consciência deste problema.

Primeiro e mais importante passo é difundir ao máximo o que o padrão rácico exige do Rottweiler e conscientizar as pessoas da importância do padrão para a própria existência da raça.

Isto será mais eficaz se fizermos um verdadeiro mutirão esclarecedor pelas redes sociais, de forma massiva e reiterada.

Temos presenciado criadores aplaudindo fotos e vídeos de Rotweilers atípicos e fora do padrão, seja por desconhecimento, seja para não desagradarem outros criadores amigos. Esta prática induz o público em geral a danoso erro e fomenta um gosto pessoal em descompasso com o que é essencial à nossa raça.

Neste aspecto, estou em uma verdadeira “cruzada”. Correndo o risco de ser antipático e desagradável, tenho censurado expressamente estas fotos e vídeos de cães disformes, procurando mostrar ao público leigo o equívoco de pensar que o Rottweiler deve ser um cão excessivamente pesado, “muito molossóide”, para usar a expressão do padrão oficial.

Pelo exposto, conclamo os criadores mais experientes e conhecedores da raça a uma atividade mais pedagógica, esclarecedora das reais características da nossa raça. Vamos às redes sociais sem receio de ferir susceptibilidades. A raça exige este sacrifício.

Por outro lado, os clubes especializados e o Conselho Brasileiro da Raça Rottweiler precisam atuar mais incisivamente para combater estas distorções danosas, através dos vários instrumentos que a moderna tecnologia nos fornece atualmente. A reforma do padrão de 2018 precisa ser explicada e divulgada.

Seria útil divulgar intensamente as palestras, as entrevistas e os textos que combatem a criação de Rottweleirs de “aparência muito pesada”, como o artigo publicado no “Anuário 2021, Rottweiler, Destaques da Raça”, de autoria do juiz e professor alemão Dr. PETER FRIEDRICH, com o título “Características Fenotípicas Questionáveis no Rottweiler”. Trata-se da excelente revista publicada por “Rottweiler de Verdade”, iniciativa de Cris Dalle Molle e Ricardo Carvalho.

Ademais, os árbitros precisam dar concretude e eficácia prática ao “espírito” desta reforma em seus julgamentos nas exposições, sejam gerais, sejam exposições especializadas, sem que tenham receio de desagradar este ou aquele criador.

Enfim, com urgência, precisamos de informação e formação massivas, amplas e constantes das características essenciais da nossa raça, consoante exigido pelo respectivo padrão. Não gostaria de continuar praticamente isolado neste mister.

 

Afranio Silva Jardim, titular do Canil Jardim Silva, registrado na CBKC deste o ano 2000.


 

 

 

 

 

 

 


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